Como já vimos, em projetos de construção, especialmente em grandes empreendimentos de infraestrutura, os desafios são constantes e multifacetados. É preciso lidar com as múltiplas partes envolvidas, longos prazos de execução, altos valores financeiros e variáveis técnicas que, ao longo do caminho, provavelmente surgirão. Nesse ambiente, o risco de disputas é inevitável: diferenças na interpretação contratual, imprevistos no solo, mudanças de escopo, prazos não cumpridos e falhas de comunicação… As possíveis ocorrências são inesgotáveis.

Tradicionalmente, essas divergências acabam sendo resolvidas por meio de processos judiciais ou arbitrais. Mas ambos os caminhos compartilham um problema central: tempo e custo. Litígios longos paralisam projetos, encarecem a obra e podem desgastar o relacionamento entre contratante e contratado.

Para enfrentar esses desafios, cresce a adoção pelos Dispute Boards. Esses comitês formados por profissionais independentes (geralmente com experiência na área de contratos complexos), são escolhidos pelas partes no momento da contratação. Sua função é acompanhar a execução do contrato desde o início, com o objetivo de prevenir e resolver conflitos de maneira rápida e econômica, com foco em orientação, prevenção e resolução contínua de controvérsias.

Dos seus principais benefícios destacam-se a segurança jurídica, a neutralidade e a especialização técnica dos membros, além do acompanhamento das obras por eles desde o início do contrato – pelo menos na maior parte dos casos. Tais fatores contribuem para a prevenção de litígios e para, no surgimento de divergência entre as partes, o proferimento de decisões mais assertivas, diminuindo a tendência de judicialização.

As decisões dos Dispute Boards, especialmente nas modalidades que emitem decisões vinculantes (como o Dispute Adjudication Board), oferecem soluções ágeis e eficazes, com efeito imediato – embora sujeitas a contestação posterior em arbitragens ou judicialmente -, o que aumenta a confiança das partes e contribui para diminuir as disputas prolongadas.

Existem três modalidades principais de pronunciamentos emitidos pelos membros do Comitê:
  • Dispute Review Board (DRB): emite recomendações não vinculantes;
  • Dispute Adjudication Board (DAB): emite decisões vinculantes, a serem cumpridas de imediato;
  • Combined Dispute Board (CDB): combina os dois modelos, podendo emitir recomendações ou decisões, conforme a situação.

Apesar das diferenças, todas as modalidades compartilham o mesmo objetivo: manter o contrato vivo, equilibrado e funcional, evitando que as partes recorram diretamente ao Judiciário ou à arbitragem.

Além disso, a maior contribuição desse mecanismo está na prevenção de conflitos. Ao acompanhar a obra em tempo real, analisando registros técnicos e realizando visitas ao local, o Dispute Board consegue identificar potenciais pontos de atrito antes que se transformem em litígios, mantendo a continuidade do projeto e evitando que as divergências entre as partes escalem.

Assim, os Dispute Boards atuam não apenas como um mecanismo de resolução eficiente de conflitos, mas, principalmente, como uma ferramenta preventiva que gera economia desde o início da obra.

Esse caráter proativo gera impacto econômico relevante. Segundo dados da Dispute Resolution Board Foundation (DRBF), cerca de 97% das disputas são solucionadas no âmbito dos Dispute Boards, evitando o avanço para arbitragens ou processos judiciais, que são naturalmente caros e demorados. A redução de litígios representa não só economia direta (honorários, indenizações, atrasos…), mas também indireta, ao preservar a previsibilidade orçamentária e a relação contratual. Afinal, cada dia de paralisação pode gerar custos muito maiores do que a manutenção de um comitê preventivo.

Outros aspectos fundamentais são a previsibilidade e a transparência na gestão do contrato. A presença contínua dos especialistas, analisando documentos técnicos e acompanhando de perto a execução, garante uma compreensão mais precisa do processo. Ao mesmo tempo, essa atuação exige uma documentação criteriosa dos fatos, o que contribui para um acompanhamento mais eficiente e para o rastreamento detalhado de cada etapa do desenvolvimento do projeto.

Embora amplamente utilizados em projetos internacionais — como os Jogos Olímpicos de Londres (2012) e o projeto europeu de fusão nuclear ITER —, os Dispute Boards ainda estão em fase de consolidação no Brasil. O marco regulatório, no entanto, já evolui: a Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) os reconhece expressamente como meios alternativos de resolução de controvérsias em contratos públicos. Trata-se de um avanço importante, que legitima o instituto em âmbito federal e estimula sua adoção em projetos de grande relevância social e econômica.

No país, a experiência já foi testada com sucesso em contratos relevantes, como a Linha 4-Amarela do metrô de São Paulo, demonstrando a eficiência e a aceitação desse modelo.

Para os leitores, a mensagem é: ao olharmos para o cenário atual, fica claro que investir na constituição de um Dispute Board representa uma alavanca para otimizar recursos, mitigar riscos e garantir resultados mais seguros e previsíveis.

O foco não é apenas solucionar conflitos, mas preveni-los de maneira eficaz, garantindo que o projeto caminhe conforme planejado, com economia de tempo e dinheiro para todos os envolvidos.

Dessa forma, mais do que um custo adicional, os Dispute Boards devem ser vistos como investimento em governança contratual. O valor destinado ao comitê costuma ser pequeno se comparado aos prejuízos de uma disputa prolongada ou de uma obra paralisada.


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